“O delegado de Itaparica (BA), José Magalhães Filho, decidiu adotar medidas polêmicas para reduzir os índices de criminalidade no município. Entre as novidades está a proibição de motociclistas usarem capacetes (iniciativa que vai contra o Código de Trânsito Brasileiro). O objetivo é identificá-los em caso de crimes praticados.
Além disso, moradores que forem viajar e não deixarem os objetos de valor em algum vizinho não poderão prestar queixa depois, afirma. Segundo ele, como há o aviso, o morador estará correndo o risco por conta.
Destino turístico de mais de 100 mil pessoas durante o verão, a ilha de Itaparica tem afugentado visitantes nos últimos anos por conta do crescimento da violência e do uso de crack.
Batizadas pela população de 'Leis Magalhães', as novas regras também estabelecem que o restaurante que receber a reserva de um grupo de turistas e não avisar a polícia sobre a chegada será responsabilizado se houver um assalto no local.
A medida não agradou a todos. Hiltomar Gusmão, 41, proprietário de uma pizzaria, é contra. 'Acho isso um absurdo. Se eu precisar ligar para a polícia toda vez que chegar um grupo de turistas, vou acabar perdendo o meu negócio pela hostilidade que irá ser criada', diz.
'Nós estamos nos disponibilizando para reforçar a segurança do grupo, para que eles possam fotografar, passear em paz. Agora, se eles não querem nos avisar, isso será problema deles', diz o delegado.
Desde que assumiu a delegacia, há seis meses, Magalhães afirma que o número de casas arrombadas por mês caiu de 80 para 4. "Nós precisamos cumprir a lei, mas ela deve ser relativizada em alguns casos. É preciso bom senso", afirma.
'Eu nem precisei fiscalizar as medidas. Só de eu dizer que iria aplicá-las, não houve nenhum registro de assalto nos últimos dias', diz o delegado, que terá uma reunião com um juiz da Vara Criminal de Itaparica para prestar esclarecimentos sobre as 'Leis Magalhães'”
O delegado está errado dos dois lados: primeiro, e óbvio, o fato de as pessoas não apresentarem notícia-crime não quer dizer que os crimes não estão ocorrendo. Se ele informa de antemão que não fará nada a respeito dos crimes, por que as pessoas vão perder tempo avisando à polícia que o crime ocorreu? O número de delitos não diminuiu. O número de delitos levados ao conhecimento da policia é que diminuiu. Embora no caso acima seja muito fácil (e mesmo jocoso) perceber a ingenuidade do raciocínio do delegado, a mensagem para quem tem de lidar com esse tipo de estatística é seria: tomem cuidado com o que é causa e o que é consequência. No caso acima, a causa da diminuição dos relatos de crimes não é a diminuição dos crimes em si, mas a atitude do delegado de estabelecer que não levará os inquéritos adiante.
O segundo erro do delegado é fazer normas. Ele não tem poder para isso. A polícia pertence ao poder Executivo, e ao poder Executivo cabe fazer cumprir as normas estabelecidas pelo Legislativo, e não criar normas. É a repartição clássica de competência entre os poderes. Quando o Executivo começa a fazer leis, cria-se uma ditadura.
PS: E como não poderia deixar de lembrar, óbvio que ainda que o delegado não tivesse “criado” essas “normas” surreais, ainda assim o número de notícias-crimes informadas à polícia a respeito de assaltos seria zero, já que na lei não existe um crime chamado assalto. Existe roubo, extorsão e furto. Mas, nunca, assalto.